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China está prestes a ultrapassar os EUA na corrida pela energia por fusão nuclear

Os EUA lideraram a fusão nuclear por décadas, mas, agora, parece que a China está em condição de vencer essa disputa

Xangai, a maior cidade da China, conhecida por suas celebrações iluminadas, vem emergindo também como um centro de inovação tecnológica. Cientistas e engenheiros locais estão impulsionando avanços em áreas como internet 6G e Inteligência Artificial. E em meio a tudo isso, uma startup em particular, chamada Energy Singularity, está perseguindo um objetivo audacioso: dominar a fusão nuclear.

Nos EUA, esse movimento é observado com preocupação. Especialistas temem que o país possa estar perdendo sua liderança no desenvolvimento de tecnologias de fusão nuclear, enquanto mais empresas chinesas entram na corrida e Pequim aumenta seus investimentos.

A fusão nuclear, o processo que ocorre no Sol, tem sido um grande desafio científico. Diversos países já conseguiram iniciar reações de fusão, mas manter de forma sustentável o verdadeiro “Santo Graal da energia limpa” ainda é um objetivo não alcançado.

Quando controlada, uma reação de fusão gera milhões de vezes mais energia do que os combustíveis fósseis e até quatro vezes mais do que a fissão nuclear, usada nas usinas nucleares atuais. Embora ainda não seja vista como uma solução de curto prazo para a crise climática, o potencial de longo prazo da fusão é imenso, e as nações estão cada vez mais dedicadas nesse sentido.

Plasma confinado no tokamak da Energy Singularity durante um experimento. Crédito: Energy Singularity

Investimentos da China em fusão nuclear superam os dos EUA

Investindo entre US$1 bilhão e US$1,5 bilhão por ano em pesquisa de fusão nuclear, a China está à frente, superando os US$800 milhões investidos pelos EUA sob o governo de Joe Biden.

Jean Paul Allain, chefe de Energia de Fusão no Departamento de Energia dos EUA, aponta que o que mais preocupa não é apenas o montante que a China está investindo, mas a rapidez com que o país asiático está avançando nessa área.

Empresas tanto americanas quanto chinesas estão otimistas em relação à viabilidade da fusão nuclear entrar na rede elétrica até 2030. No entanto, os desafios são consideráveis. Embora os EUA ainda liderem a pesquisa nessa área desde a década de 1950, a China está acelerando seus esforços de inovação, principalmente desde 2015. De lá para cá, o número de patentes relacionadas à fusão nuclear na China superou as de qualquer outra nação, sinalizando o crescente avanço do país no setor.

A startup Energy Singularity desenvolveu um tokamak – a máquina responsável por conter e manter as reações de fusão – em apenas três anos. O uso de ímãs supercondutores de alta temperatura no tokamak da empresa representa um avanço em relação aos modelos tradicionais, permitindo reatores menores e mais eficientes. Essa tecnologia pode ser um divisor de águas, possibilitando a fusão em escalas mais comerciais.

Com US$112 milhões em capital privado já captado, a Energy Singularity planeja construir um segundo tokamak até 2027, um marco importante para demonstrar a viabilidade comercial da fusão nuclear. O objetivo é colocar a tecnologia em operação na rede elétrica até 2035.

Infraestrutura norte-americana de fusão nuclear está defasando

Enquanto isso, nos EUA, a infraestrutura de pesquisa de fusão nuclear está envelhecendo. Andrew Holland, CEO da Fusion Industry Association, destaca que os tokamaks americanos, como o DIII-D, têm mais de 30 anos de uso. Isso contrasta com o rápido progresso chinês, que inclui o parque de pesquisa CRAFT, um centro avaliado em US$570 milhões que será inaugurado em breve.

“Não temos nada parecido”, disse ele à CNN. “Não há instalações modernas de fusão nos laboratórios nacionais americanos”.

Um soldador trabalhando no parque de pesquisa de fusão CRAFT, em Hefei, leste da China, para inauguração do tokamak BEST, em 2027. Crédito: Xinhua

Holland também observa que muitas das inovações chinesas são baseadas em designs americanos. Por exemplo, o tokamak BEST, que será concluído em 2027 e financiado pelo governo chinês, é uma cópia de um design da empresa americana Commonwealth Fusion Systems. Outro tokamak em construção por uma empresa chinesa segue um design da americana Helion.

Essa “cópia” de tecnologias americanas já foi uma estratégia comum para a China em outras indústrias, como a solar. No entanto, essa tendência está gerando preocupações de que os americanos possam perder o controle sobre a cadeia de suprimentos global no setor de fusão nuclear.

A fusão nuclear é um processo que envolve a união de dois núcleos atômicos a temperaturas extremamente altas, como as encontradas no centro do Sol. Esse processo libera uma enorme quantidade de energia, que pode ser convertida em eletricidade. Embora o método mais comumente pesquisado seja o uso de tokamaks, os EUA também estão investindo em alternativas, como a fusão a laser.

No fim de 2022, cientistas americanos conseguiram um feito histórico ao gerar um ganho líquido de energia em um experimento de fusão a laser, o primeiro de seu tipo. Apesar desse avanço significativo, a fusão a laser ainda enfrenta desafios técnicos, e muitos especialistas acreditam que o tokamak seja a abordagem mais viável no curto prazo.

Um componente do sistema de laser do Laboratório Nacional Lawrence Livermore, nos EUA, onde os cientistas conseguiram com sucesso a “ignição” para produzir uma reação de fusão. Crédito: Damien Jemison / Laboratório Nacional Lawrence Livermore

Se os avanços da China continuarem em ritmo acelerado, Xangai não será apenas uma vitrine de inovação tecnológica, mas também poderá se consolidar como uma potência global no desenvolvimento de energia limpa por meio da fusão nuclear.

(DA REDAÇÃO \\ Guto Gutemberg)

(INF.\FONTE: Flavia Correia \\ Olhar Digital)

(FT.\CRÉD.: Xinhua \\ Divulgação)